A Literatura e a Tecnologia — amigas ou rivais?

30 de julho de 2022 - Regiane Silva

Uma estante de livros, uma bonequinha e o Kindle.

O que é literatura?

Abranger o significado de literatura é mais complexo do que parece. Alguns consideram-na uma manifestação artística do ser humano. Representa comunicação, linguagem e criatividade, sendo considerada a arte das palavras.

Para o pensador grego Aristóteles, a literatura era uma imitação ou representação da realidade mediante as palavras.

Dependendo da civilização em que é escrita ou a época em que é produzida, uma obra pode ou não significar literatura.

De tal maneira, a literatura pode representar histórias fictícias de autores de determinadas épocas e lugares, sejam poemas, romances, contos, crônicas e novelas.

E qual seria a função da literatura? Não existe uma resposta certa para essa questão, pois para cada pessoa a literatura tem um efeito diferente. Para alguns, ler um poema é uma forma de entender seus sentimentos, enquanto para outros é uma maneira de conhecer o mundo por meio da leitura, já para outros, é autoconhecimento e um entendimento da sociedade em que vivem. Moisés (A criação literária: poesia e prosa, 2012, p.28) comenta que

a arte literária não se reduz (ou não deve se reduzir) a uma forma banal de entretenimento. […] mais do que recreação de alto nível, a Literatura constitui uma forma de conhecer o mundo e os seres humanos: convicta de ser acionada por uma ‘missão’, ela colabora para o desvendamento daquilo que todos nós, conscientemente ou não, perseguimos durante a existência. E, portanto, se a vida de cada um corresponde a um esforço persistente de conhecimento, superação e libertação, à Literatura cabe um lugar de relevo, como ficção expressa por meio de vocábulos polivalentes.

A arte literária representa recriações da realidade de maneira artística. Dessa forma, possui um importante papel social e cultural no contexto em que fora criada, provocando sensações e reflexões ao leitor.

Portanto, não há como definir uma função para a literatura, mas pode-se afirmar que ela é importante para a construção do homem enquanto sujeito e cidadão. Por meio da leitura é possível conhecer a si mesmo e as diversas dinâmicas sociais do mundo.

Uma tela de celular, uma tela de tablet, um monitor um moço com um livro

Tecnologia x Literatura

Percebe-se que a Literatura é algo importante na vida do ser humano. Muitos concordariam com as palavras da autora Jennifer Donnelly, que escreveu:

A leitura tornou-se meu maior prazer […] Encontrei tantas coisas naqueles livros. Encontrei histórias que me inspiraram, poemas que me encararam, romances que me desafiaram […] Na verdade, era ali que eu me encontrava comigo mesma. (Bela, Perdida em um livro, 2017, p.19)

Apesar da importância da literatura na vida do homem, o interesse por ela foi se perdendo com o passar dos anos. Com o movimento tecnológico acelerando cada vez mais, a atenção das pessoas passou a ser requisitada em várias direções o tempo todo.

Inicialmente, eram os televisores que roubavam o tempo livre das famílias, que se reuniam à noite e aos finais de semana para assistir às programações variadas que as redes televisíveis produziam. Atualmente, tem-se a tecnologia na palma da mão. Não há necessidade de estar em determinado local e hora para ter acesso a informações e conteúdos. Os celulares, cada vez mais parecidos com os computadores, substituíram o papel, os jornais, as cartas, as revistas e os livros. São vídeos, áudios, textos e imagens sendo recebidos a todo momento, consumindo o tempo e a energia daqueles que estão conectados. Não há necessidade nem de estar perto de uma rede Wi-Fi para se conectar, os próprios planos das operadoras fornecem internet para seus clientes.

Diz-se por aí que algumas pessoas têm paciência para ficar duas horas rolando a tela do celular em suas redes sociais, mas não têm paciência para gastar quinze minutos com a leitura de um livro.

Entretanto, não são apenas as distrações que a tecnologia traz que fez os livros ficarem em segundo plano. Até alguns anos atrás, a culpa pela falta de interesse na leitura poderia recair sobre os preços dos livros, os impostos altos exigidos pelo governo, fazendo as editoras cobrarem um valor maior pelas obras em nosso país. Nem todos os brasileiros têm uma renda digna de uma vida confortável, sobrando espaço para investir em literatura.

No entanto, a tecnologia trouxe uma solução para esse problema: os e-books, livros digitais em nossa tradução.

Um celular em uma cesta com pétalas de rosas.

A era dos e-books

Para entender o que é um e-book, podemos partir do conceito de livro.

De acordo com o site Conceito.de (2012), em geral, conhece-se como livro qualquer obra literária, científica ou de outro tipo, que tenha a extensão necessária para formar um volume. Em alguns casos, há o questionamento se um livro pode ir além de um conjunto de folhas de papel.

Como autora de romances e novelas, trarei como ponto principal dessa análise que um livro é o seu conteúdo, e não apenas um formato físico encadernado.

Partindo daí, chegamos ao e-book, um livro digital que pode ser lido e criado graças ao avanço tecnológico, que nos possibilita uma variedade de formatos e suportes para fazer a leitura. Os sites de autopublicação facilitaram o lançamento de centenas de novos autores independentes, o que popularizou esse formato de livro. O conteúdo dos e-books pode ser acessado por meio de um computador, tablet, celular e dispositivos criados somente para esse tipo de leitura, como o Kindle — leitor de livros digitais da Amazon.

Os livros digitais suprem algumas necessidades, que antes eram consideradas os motivos da falta de leitores no nosso país. A primeira é a praticidade. Algumas pessoas reclamavam pela falta de tempo para ler, mas quando se tem o livro na palma da mão, dentro de um dispositivo móvel, como o celular que todos carregam aonde vão, não há desculpas para não ler enquanto se espera na fila da lotérica ou aguarda ser chamado no consultório médico. A segunda, resolve o problema financeiro dos valores altos dos livros físicos. Como os e-books não demandam de gastos com impressão e distribuição, pode-se encontrar livros de R$1,99 a R$15 que teriam o preço mais elevado em uma livraria.

Neste formato eletrônico, eles são mais acessíveis e vantajosos, pois também fica a critério do leitor fazer alterações como aumento de fonte, escurecer o fundo da tela para a leitura ficar mais confortável e não ter que armazenar os livros em espaços apertados nas casas.

Para muitos, o e-book não traz a mesma experiência de se ler um livro físico. Talvez compartilham o mesmo pensamento de Bela, personagem do livro da autora Jenniffer Donnelly, já mencionada.

Amava admirá-los, sentir seu cheiro, seu doce peso nos braços. Acima de tudo, ela adorava o que sentia toda vez que pegava um livro: sentia como se segurasse um mundo inteiro nas mãos. (Bela, Perdida em um livro, 2017, p. 33)

Conforme a tecnologia foi avançando, os livros acompanharam o progresso. Talvez podem ter escolhido esse caminho para a sobrevivência da literatura, mas também foi uma maneira inteligente de atrair um novo tipo de leitor; alguém que esteja apenas interessado na história a ser lida, em vez da experiência de ter o livro físico em mãos.

O livro digital ajuda a formar leitores. Uma prova disso é o grande número de leitores do aplicativo Kindle Unlimited da Amazon. Em redes sociais, como Instagram e TIKTOK, encontra-se milhares de leitores influenciados por outros criadores de conteúdos a lerem determinados livros. Trends no TIKTOK (tendências que acontecem dentro do aplicativo) convencem mais uma pessoa a ler determinado livro do que uma resenha ou foto publicitária. Vídeos com músicas famosas, onde o leitor cria o universo de determinada história, toca mais o coração do leitor, criando a vontade de ler aquele livro, do que as escolas nas aulas de literatura.

Enquanto se diz que as redes sociais estão matando os leitores, também podemos chegar à conclusão de que elas incentivam aqueles que estão à procura de livros. A revista Veja divulgou uma matéria em agosto de 2021 com o seguinte título: “Venda de livros cresce 50% impulsionada por ofertas e redes sociais. Primeiro semestre do ano registrou mais de 28 milhões de obras vendidas, 9 milhões a mais que o mesmo período de 2020”.

A matéria diz que somente no primeiro semestre de 2021, mais de 28 milhões de livros foram vendidos no Brasil, um salto de 48,5% em relação aos 18,9 milhões de exemplares vendidos no mesmo período de 2020.

Os eventos literários, como a Bienal do Livro no Rio de Janeiro e em São Paulo, contam com a presença de um público enorme. Segundo o site Agência do Brasil, em 2021, a Bienal do Livro no Rio de Janeiro vendeu dois milhões de obras, mesmo com seu formato híbrido devido à pandemia. “De acordo com o balanço apresentado […], 34,5% do público presente no Riocentro estiveram no evento pela primeira vez e 50,8% tinham entre 18 e 25 anos. Das 250 mil pessoas que passaram pelos três pavilhões, na Barra da Tijuca, 99% compraram pelo menos um livro. A média foi de seis livros adquiridos por visitante”, diz a matéria de Alana Granda.

Percebe-se os novos hábitos de leitura: pessoas lendo em transportes públicos, seja em seus dispositivos móveis ou com livros físicos; vídeos e postagens na internet com indicações de leituras e as vendas subindo cada vez mais em sites como Amazon e Submarino.

Garota lendo um livro.

Parafraseando Mario de Andrade, “Movo como eles as mesmas águas da modernidade […] é seguir o espírito duma época” (Andrade, Bandeira, 2000, p.62), conclui-se que a literatura, desde o início de sua criação, acompanhou as adaptações da evolução humana e ela continua se adaptando apesar dos avanços tecnológicos. Ela passa por uma fase de popularização em nosso país.

Mesmo que o suporte e o formato de leitura se modifiquem com o tempo, o texto permanece; o desejo e a atração pelo ato de ler ainda é ilimitado. A tecnologia não é inimiga da literatura, ela pode ser uma grande aliada para aqueles que querem ingressar nesse universo e não sabe por onde ou como começar.

As telas do presente não ignoram a cultura escrita, mas a transmitem. (Chartie, 2002, p. 30)

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Foto Regiane Silva Regiane Silva

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