Pés flutuantes

4 de novembro de 2022 - Regiane Silva

Mar à noite.

Eu gostava de sentir a brisa bater contra meu rosto enquanto mantinha minha cabeça inclinada para olhar as estrelas. As noites sempre tiveram um toque mágico em minha vida. Sentia-me mais conectada com a fonte criadora durante a escuridão conforme observava a imensidão do espaço, sentindo-me pequena comparada com a vida ao meu redor. O desconhecido que a noite trazia era instigante e estimulante.

O manto de estrelas estendido acima de minha cabeça era fascinantemente belo, mas não se comparava com a conexão que eu tinha com a lua. Eu fazia questão de separar alguns minutos antes de dormir para admirá-la. Com sua majestosidade, brilhava naquele instante com tanta força que não havia necessidade de acender as luzes do lado de fora das casas.

Eu me sentia segura nas noites. Gostava quando o dia escurecia, visto que significava que um novo começo surgiria em breve.

— Posso te fazer companhia? — um moço perguntou ao se aproximar com cautela.

— Claro — respondi.

Continuei olhando o horizonte. Concentrei minha mente no som do mar, que reluzia em um brilho atravessado em suas pequenas ondas devido à luz do luar. Estas quebravam na areia da praia incansavelmente.

Aquela atmosfera encantadora me fazia pensar, questionar tudo que me foi ensinado.

Como eu poderia acreditar que a vida se baseava em metas criadas para um futuro distante e uma velhice confortável?

O ser humano acreditava que, ao obter o controle de tudo, as coisas se acertariam e a vida enfim fluiria. Isso era um grande engano. Passei minha vida vivendo sob as rédeas do controle; graças a isso, apenas consegui gerar uma ansiedade que não me abandonaria.

Liberdade. Era o que eu precisava. LIBERDADE.

Eram dez horas da noite, eu estava sem pressa para ir para cama. Escolhi aproveitar os presentes da natureza e sentir a paz se tornar a regente do meu ser naquele instante.

Perdida nesses pensamentos, esqueci-me do moço ao meu lado. Um longo suspiro de apreciação dado por ele me fez sorrir ao olhá-lo.

— É bom encontrar pessoas que apreciam essa sensação — disse ele com o olhar perdido no mar.

— Não é comum isso? — perguntei.

Arrumei minha postura, uma vez que minha coluna começou a doer. A mureta de concreto que dividia o asfalto da praia não era o melhor banco para passar muito tempo sentada.

— Não, normalmente os turistas vão embora após o pôr do sol para curtirem a cidade. Esta praia só fica cheia durante o dia.

— Isso é triste. Pode estar escuro, mas, para mim, está mais bonito do que durante o dia.

— Também acho.

Mais alguns minutos de silêncio, retirei minhas sandálias e me despedi do rapaz para ir caminhar pela areia.

Percebi quanto minha vida mudou nos últimos meses e isso era gratificante. Enchia meu peito de emoção, a ponto de não me considerar merecedora de tanta felicidade alcançada ao me desprender do controle. Aquele controle que me prendia no lugar.

Mesmo sabendo da importância de ter os pés no chão, em alguns momentos, eu gostava de desprendê-los e deixá-los flutuar sem rumo. Se eu me perdesse, não teria problema, sentia-me capaz de voltar para a estrada certa e apreciaria a textura do chão novamente.

A vida era assim, simples. Era uma lástima nascer com o pensamento errado a respeito dela.

Voltei para a pousada em que eu estava hospedada e, após um banho para remover toda a areia do meu corpo, sentei-me à escrivaninha, deixando a janela aberta para a brisa entrar. Eu precisava escrever sobre aquele dia, mais pessoas precisavam saber que aquela sensação de liberdade existia.

Crônica de Regiane Silva.

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Foto Regiane Silva Regiane Silva

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